domingo, 4 de agosto de 2013

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http://pipocamoderna.com.br/apenas-o-vento-encena-cotidiano-de-medo-e-crimes-de-odio-racial/265288


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Apenas o Vento encena cotidiano de medo e crimes de ódio racial


O aviso que abre o drama húngaro “Apenas o Vento” alerta o espectador para o fato de o filme não ser um documentário, embora seja inspirado em fatos reais. Entre 2008 e 2009, na Hungria, um grupo de extrema direita teria assassinado seis ciganos, entre eles mulheres e crianças, além de praticar diversos atos de violência contra essa etnia.
É a partir desse fato que o diretor Benedek Fliegauf (“Ventre”) vai desenvolver sua trama, ao retratar a rotina de uma família cigana cercada pelo medo das mortes que estão ocorrendo no vilarejo onde vivem. O filme rendeu ao diretor o Urso de Prata no Festival de Berlim, em 2012.

Fliegauf desenvolve uma perspectiva em que revela uma permanente violência subentendida no preconceito atávico que afeta os personagens. Ao mesmo tempo, cria uma atmosfera de tensão, como se a explosão trágica dessa violência subentendida estivesse sempre perto de acontecer.
Feito uma ironia ante o aviso que abre o filme, a câmera do diretor está sempre próxima de seus personagens. Com isso, além do efeito natural de uma atmosfera sufocante em um cotidiano árido, essa proximidade da câmera gera uma perspectiva de “documento”, de registro fiel não aos acontecimentos reais, mas a uma realidade que na ficção encontra sua voz de denúncia.

É sob essa ótica de proximidade quase íntima que seguimos o dia de três personagens, interpretados por atores amadores, que não tiveram nenhum outro papel no cinema e poderiam muito bem estar interpretando a si mesmos.
Mari (Katalin Toldi) vive numa aldeia com o pai inválido e seus dois filhos: a adolescente Anna (Gyöngyi Lendvai) e o menino Rió (Lajos Sárkány). Com a notícia do assassinato de uma família de ciganos da mesma aldeia em que vivem, o filme acompanhará o dia desses três personagens, da manhã até a noite. Enquanto Mari se desdobra em dois empregos, as crianças devem ir à escola. E em meio a esta rotina, testemunha-se o preconceito contra ciganos se manifestar em detalhes, que vão do simbólico, como um ônibus que para depois do ponto, até o ostensivo, como o diálogo entre dois policiais.

A violência também é subentendida – seja nos pequenos abusos, seja na condição precária de vida – e serve de prenúncio para a violência real. A relação entre esses elementos é estabelecida ao longo do dia pela câmera sempre próxima, como se o espaço desses personagens no mundo fosse menor que o de outras pessoas. É uma proximidade que não apenas sufoca, mas restringe, apequena, no sentido espacial e humano, a dignidade que deveria ser universal e ampla. Mas não é.
Fliegauf se mostra muito feliz na construção dessa atmosfera que traduz sentimento e medo. Seu filme tem como propósito revelar fatos que se costuma ignorar. Num jogo de desconstrução entre o que afirma (o alerta do início do filme) e o que mostra, exime-se do rótulo de documento, para à sua maneira ficcional melhor documentar.
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Apenas o Vento

(Csac a Szél, Hungria, 2012)

 ★★½☆☆




http://atarde.uol.com.br/cinema/materias/1521705-apenas-o-vento-e-retrato-do-racismo-na-hungria

Seg , 29/07/2013 às 10:26

'Apenas O Vento' é retrato do racismo na Hungria

Luiz Carlos Merten | Agência Estado
Benedek (também chamado de Bence) Fliegauf possui referências e preferências disparatadas. Admira os irmãos Dardenne, Miranda July e Paul Greengrass e, em fevereiro do ano passado, em Berlim, confessou que seu filme recente preferido, em anos, era Headhunters, do nórdico Morten Tyldum, do qual gostava justamente por ser um thriller sombrio. Nada disso parece juntar, mas deu certo em Apenas o Vento, quinto longa de Fliegauf, que venceu o Urso de Prata na Berlinale de 2012. Se tivesse vencido o de Ouro, ninguém iria reclamar - mas era o ano de César Deve Morrer, dos irmãos Taviani, e o júri fez a coisa certa.
Apenas o Vento é definido pelo próprio diretor como cinema social (os Dardennes?) com uma pegada de thriller dark (Greengrass? Tyldum?). Fliegauf morava - e trabalhava - na Alemanha quando, em 2008 e 2009, acompanhou pela imprensa o que se passava no país em que nasceu, a Hungria. Uma série de ataques a ciganos - casas incendiadas, tiros desferidos contra pessoas desarmadas, crianças inclusive - produziram pelo menos 55 vítimas. Seis morreram, cinco tiveram ferimentos graves.
Num encontro com a reportagem, Fliegauf disse que foi uma sensação estranha ler a cobertura da imprensa estrangeira (alemã) sobre o que se passava.
"Já havia feito curtas, quatro longas, um em língua inglesa (Womb). Abandonei o projeto no qual trabalhava e voltei com minha família para a Hungria, para tentar entender o que se passava, já disposto a fazer um filme." Para Fliegauf, o empobrecimento geral da população e o racismo contra os ciganos, transformados em bodes expiatórios da crise, forneciam um retrato explosivo da situação no país. Durante dois anos ele pesquisou. Entrevistou grupos de ciganos em diferentes regiões. Sua intenção era fazer o filme com atores ciganos. Não encontrou o que procurava. Resolveu fazê-lo com não profissionais, como outros filmes de sua carreira. Foi mais difícil do que esperava.
"Descobri que há mais racismo entre os próprios ciganos do que seria desejável. E eles só queriam fazer o filme se fosse para a televisão, em busca de celebridade." Nascido em Budapeste, em 1974, Fliegauf ainda não chegou aos ‘enta’. Na época da entrevista, não tinha nem 38 anos - estava com 37. Seus curtas e longas lhe deram projeção no cinema do país, e ele agradece ao mítico Miklos Jancso, de quem foi assistente. Baseado em documentação, ele criou sua história: uma família de ciganos que vive numa área afastada, na floresta. A mãe trabalha, os filhos - o ponto de vista é o do garoto - estudam, mas se envolvem em atividades, digamos, ilícitas. Há um velho e o pai, ausente, está no Canadá, à espera de levar a família.

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