terça-feira, 5 de abril de 2016

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Autossuficiência dos refugiados é tema de projeto social no Paraná

sexta 01. abril 2016 12:00 Tempo: 4 days
© ACNUR/ Michele Bravos
Said e Hazuam, vivendo no Brasil, veem na culinária uma possibilidade de se manterem financeiramente no país.
Curitiba, 01 de abril de 2016 (ACNUR) - Os irmãos sírios Said e Hazuam Kanoush* são, respectivamente, engenheiro e dentista. Mas na semana passada assumiram o papel de chefs de cozinha, ensinando ao público brasileiros como preparar uma típica comida árabe.
A aula, que aconteceu em Curitba (PR), não foi apenas um compartilhar de saberes, mas marcou o lançamento do Projeto Linyon, que tem o objetivo de promover a autossuficiência de refugiados que vivem no Brasil, associada ao desenvolvimento das comunidades onde eles se encontram.
Os irmãos - refugiados do conflito sírio, vivendo no Brasil - explicam que querem trabalhar com comidas árabes (atendendo por encomenda ou realizando jantares típicos a domicílio) enquanto não for possível atuar em suas áreas de especialização. “Nesta noite, estamos divulgando o que sabemos fazer e conhecendo outras pessoas da cidade”, conta Hazuam.
Ainda que muitos refugiados possuam diplomas universitários, a integração econômica no Brasil tem sido difícil. O processo de revalidação desses diplomas leva tempo. Por isso, mesmo aqueles considerados mão de obra qualificada, com graduação acadêmica, têm que trabalhar em áreas diferentes da sua formação.
© ACNUR/ Michele Bravos
© ACNUR/ Michele Bravos
O sírio Said é engenheiro e, no Brasil, compartilha seus conhecimentos como chefs de cozinha pelo Projeto Linyon.
A internacionalista Marcela Milano, idealizadora do Projeto Linyon, conta que o projeto está focado em fomentar o empreendedorismo e contribuir para uma cultura integrativa. “Queremos gerar empatia entre os refugiados e os que já vivem na cidade, possibilitando uma quebra de preconceito”. Marcela percebe que alternativas de geração de renda são uma opção para esta população. “Os refugiados precisam ter sua autonomia financeira e se integrarem ao novo país”.
Este primeiro evento foi dedicado à promoção da cultura árabe. Mas o Projeto Linyon também tem trabalhado com outras populações, como haitianos e migrantes vindos do continente africano.
Mobilização virtual – Said, hoje com 30 anos, foi o primeiro dos irmãos a chegar ao Brasil, em 2014. Nos primeiros meses, resolveu abrir um restaurante árabe, porém não tinha consciência do processo burocrático que isso envolvia, nem da dificuldade que seria para criar uma clientela.
Ao ver o restaurante vazio, a escrivã Deborah Torres, 37 anos, resolveu divulgar o local em um grupo no Facebook. “Pensei que precisava fazer alguma coisa para movimentar aquele lugar e ajudar os refugiados”, diz Deborah. Logo, formou-se uma rede que abraçou a causa dessa família síria.
Mas com pouco tempo de negócio aberto, o restaurante foi assaltado, deixando um enorme prejuízo para Said. Com a ajuda de uma rede de apoio, Said conseguiu se estabilizar e até trazer o seu irmão Hazuam para o Brasil. “Nós conseguimos arrecadar 6 mil reais para trazer o irmão de Said. Vendemos muitas rifas! ”, conta Deborah. O objetivo agora é trazer a mãe dos rapazes e a esposa grávida de Hazuam.
© ACNUR/ Michele Bravos
© ACNUR/ Michele Bravos
Os sírios Said e Hazuam posam para uma foto ao lado da equipe que integra o projeto Linyon, em Curitiba.
A busca pela autossuficiência cria novas perspectivas para Said e Hazuam, vítimas de um conflito que já dura mais de cinco anos e que já gerou quase 5 milhões de refugiados em todo o mundo. Said deixou seu país por se recusar a integrar as forças armadas. “Não queria lutar. Não queria morrer”, conta. Após deixar a Síria, foi para o Líbano e conseguiu apoio em uma igreja local. Por meio de contatos desta instituição, acabou vindo para o Brasil e se estabeleceu no Paraná.
Atualmente, ele trabalha em uma lanchonete no centro da cidade, das 19h às 5h. Em seguida, após descansar um pouco, vai para a segunda jornada de trabalho, das 10h às 19h. Dessa vez, como vendedor de pão sírio, distribuindo o produto nos restaurantes; e como vendedor de roupa, as quais busca em São Paulo. Até que o diploma seja revalidado e ele possa atuar como engenheiro, Said está confiante na possibilidade de também trabalhar com as encomendas de comida árabe.
O dentista sírio Hazuam Kanoush, 35 anos, sempre teve os olhos voltados para o mundo e sonhos que extrapolavam as fronteiras de seu país. Logo que se formou em odontologia, em 2003, mudou-se para o Canadá para poupar dinheiro para a construção do seu consultório. Quatro anos depois, retornou ao país de origem e realizou o seu desejo.
“Sabe quando você passa toda a sua vida para realizar um sonho? Sinto que eu dediquei mais da metade dela para os estudos, para alcançar o que eu queria”. Mas a guerra em seu país destruiu seus sonhos, e ele acabou deixando a Síria novamente – desta vez, para viver como refugiado no Brasil, onde chegou no começo deste ano.
Dentro de algumas semanas, Hazuam será pai de sua primeira filha, que se chamará Nicolli. “Quando você vai ser pai, você quer que seu bebê cresça em um ambiente melhor. Eu tenho esperança nisso, por isso estou aqui”.
*Os nomes dos refugiados nesta matéria foram alterados a pedido dos mesmos.
Por Michele Bravos, de Curitiba (PR).
Por: ACNUR

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