ORGANIZAÇÕES LANÇAM MANIFESTO PELA HUMANIZAÇÃO DA COBERTURA MIDIÁTICA SOBRE AS MIGRAÇÕES NO BRASIL
Os(as) integrantes
de associações e grupos de migrantes, de organizações de apoio às migrações e de
movimentos sociais têm acompanhado com apreensão a realidade enfrentada
pelos(as) imigrantes procedentes do Haiti e de países africanos na fronteira da
região norte do Brasil e pelos(as) imigrantes sul-americanos(as) em grandes
cidades brasileiras, assim como a cobertura dada a essa realidade pela mídia
brasileira e internacional que, tem assumido, em muitos casos, um tom de
criminalização e alarmismo que não atende a princípios dos direitos humanos e
não contribui para a inserção cidadã desses(as) imigrantes na sociedade
brasileira.
O
Congresso Nacional e diversos setores e organizações sociais vêm trabalhando em
mudanças na legislação migratória brasileira na perspectiva de ampliação dos
direitos dos(as) imigrantes que residem no país. Essas instâncias defendem a
criação de uma nova Lei de Migração que não reproduza o mesmo “espírito” do
Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/80) atualmente em vigor que, herança da
ditadura militar, distingue subcategorias de cidadãos(ãs) e pessoas com mais e
pessoas com menos direitos. Para essa mudança, estão em tramitação no Congresso,
duas propostas de emendas parlamentares que tratam sobre os direitos políticos
dos(as) imigrantes (PEC 119/11 e PEC 25/2012).
Ou
seja, setores do Estado e da sociedade brasileira têm se manifestado favoráveis
a um novo paradigma para a legislação migratória baseado nos direitos humanos e
no tratamento não discriminatório dos(as) imigrantes no atual contexto de
incremento das migrações internacionais para o Brasil. Entendemos que, nesse
contexto, as mídias têm um papel relevante e estratégico que pode ser exercido
através de uma abordagem humanizada do fenômeno migratório que não contribua
para reforçar situações de desigualdades, discriminação, racismo, xenofobia e
violência em relação aos(às) imigrantes.
As
entidades signatárias dessa nota, que atuam no atendimento e apoio dos(as)
imigrantes e nos processos de formulação de políticas públicas orientadas às
migrações transnacionais no Brasil, entendem que uma cobertura midiática
comprometida com os direitos humanos das migrações transnacionais nos contextos
nacional e internacional deveria estar atenta aos seguintes aspectos:
-
A abordagem da migração como experiência
sociocultural que envolve sujeitos e vidas humanas e não apenas como fenômeno de natureza
demográfica ou estatística contribui para focalizar as migrações como tema e não
como problema.
-
Em notícias que informam sobre o aumento da chegada de determinado fluxo
migratório, o uso determinologias
que relacionam a vinda destes(as) migrantes à ideia de invasão e
avalanche contribuem para criar
um clima de alarmismo e medo em torno do ingresso de imigrantes no Brasil.
-
Do ponto de vista dos direitos humanos, todo(a) cidadão(ã) tem direito à livre
circulação e residência e, nessa perspectiva, o uso de termos como ilegal, irregular, clandestino(a) e indocumentado(a),
pode assumir uma conotação pejorativa. Em notícias que exigem focalizar a
situação de permanência do(a) migrante no país, é importante não confundir
infração de natureza administrativa com infração de ordem criminosa a partir do
uso de termos como “ilegal”.
-
A relação, de modo generalizado, dos grupos migrantes, da condição de
estrangeiro(a) ou da nacionalidade a situações
de criminalidade, delinquência e conflito não contribui para a compreensão da complexa
diversidade que constitui a realidade migratória contemporânea.
-
Embora parte das migrações internacionais tenha motivações econômicas, a ênfase
a aspectos relacionados unicamente às situações de carência e precariedade
vividas pelos(as) migrantes e seus países de origem pode reforçar a associação
entre imigração e pobreza e
diluir a diversidade de situações, realidades e motivações vividas pelas pessoas
que migram.
-
Os(as) migrantes e os(as) representantes de suas redes, associações e
organizações de apoio às migrações, e não apenas as instituições governamentais,
podem participar diretamente como fontes
de informação sobre a realidade migratória, desde que observados os
cuidados necessários com aqueles(as) imigrantes que foram vítimas de tráfico de
pessoas ou vivem a condição de refugiados(as).
-
Os(as) migrantes são sujeitos de dinâmicas cotidianas de inserção na sociedade
brasileira e podem participar como fontes
de notícias não apenas de temáticas que tenham vinculação direta com a realidade
migratória, mas em todas as que sejam de interesse da sociedade em geral.
Uma atenção especial precisa ser dada aos(às) refugiados(as) e vítimas de
tráfico de pessoas em termos de tratamento de imagem e conteúdo.
-
O excesso
de dados estatísticos sobre as migrações e o uso de cifras que quantificam as migrações no Brasil e no
mundo tendem a destacar aspectos quantitativos em detrimento de aspectos
qualitativos que contextualizam os processos migratórios. Além disso, esses
dados excluem, muitas vezes, a presença e realidade de migrantes que não estão
registrados(as) nos órgãos governamentais responsáveis pela migração.
Especialistas que estudam a temática migratória podem contribuir para essa
contextualização dos dados estatísticos no processo de produção das
notícias.
-
A inclusão
ou ênfase, nas notícias, de referência ao grupo étnico, à cor da pele, ao país
de origem, ou à religião, pode, em alguns casos, reforçar estereótipos e
preconceitos sobre determinados grupos migratórios e nem sempre é necessária
para a compreensão global da notícia.
Essas
e outras orientações estão disponíveis, de modo ampliado, no Guia das Migrações
Transnacionais e Diversidade Cultural para Comunicadores, publicação produzida
por um grupo de pesquisadores(as) e integrantes de organizações migratórias
brasileiras na perspectiva de contribuir com o trabalho realizado por
comunicadores(as) e jornalistas na cobertura midiática das migrações. O Guia
pode ser consultado e baixado gratuitamente em www.guiamigracoesdivcult.com
São Paulo/Porto Alegre, 3 de maio de 2013.
Assinam:
Articulação
Sulamericana Espaço Sem Fronteiras
Associação
de Empreendedores Bolivianos da Rua Coimbra/SP
Associação
de Imigrantes Paraguaios em São Paulo/Japayke
Associação
Latino Americana de Arte e Cultura Andina/ALAC
Associação
Latinoamericana de Micro, Pequenas e Médias Empresas/AlampymeBR
Associação
Salvador Allende
Casa
das Áfricas
Central
Geral dos Trabalhadores do Brasil/CGTB
Central
Única dos Trabalhadores/CUT
Centro
de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante/CDHIC
Convergência
das Culturas/Equipe de Base Warmis
Cooperativa
dos Empreendedores Bolivianos e Imigrantes em Vestuário e Confecção/
COEBIVECO
Coordenação
Nacional de Entidades Negras – São Paolo/CONEN SP
Fórum
Permanente da Mobilidade Humana do Rio Grande do Sul/ Porto Alegre
Fórum
Social pela Integração e Direitos Humanos dos Migrantes no Brasil
Grito
dos Excluídos Continental
Grupo
Cultural Chile Lindo
Instituto do
Desenvolvimento da Diáspora Africana no Brasil/IDDAB
Presença
da América Latina/PAL
Projeto
de Extensão Universitária “Educar Para O Mundo”/IRI-USP
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